Reciclar pode dar lucro

O lucro obtido pode ser empresarial e para o meio ambiente

Por Luiz Roberto Bendia, editor do Jornal dos Amigos e
Secretário Estadual de Comunicação do PV Minas Gerais

O Brasil joga fora por ano cerca de 8 bilhões de reais porque não recicla seu lixo urbano. Nesse valor está incluído todos os gastos com tratamento de detritos nos chamados lixões e custo de produção de novos materiais. Dos cerca de 5.500 municípios brasileiros, pouco mais de 3% tem algum programa de coleta seletiva de lixo, ou seja, operam a separação dos quatro tipos de dejetos não-orgânicos (papel, vidro, plástico e metal). Comparando com os Estados Unidos (que não assinaram o tratado de Kioto), mais de 10 mil condados (cerca de 9%) praticam a coleta seletiva. Sabe-se que na Austrália e no Japão o índice é de 100%.

Um dado alarmante é a quantidade de lixo produzido por dia no Brasil: Cerca de 130 mil toneladas por dia. E só não produz mais por causa da recessão. E desse total, a metrópole de São Paulo é responsável por cerca de 20 mil toneladas/dia.

No chamado primeiro mundo, o lixo orgânico -composto de restos de comida- é transformado em adubo por um processo químico chamado compostagem. Só agora o processo começa timidamente ser praticado no Brasil.

O Brasil, por sua extensão territorial, pode se dar ao luxo de dispor de aterros sanitários, como fazem Estados Unidos e Rússia. O mesmo não acontece com os países da Europa, em que a alternativa é uma só: reciclar. Por causa disso, os centros de pesquisa pensam noite e dia formas de reutilização de materiais. É o que vamos tratar a seguir com experiências em reciclagem.

Explicação do ciclo global

O ciclo global de produção de materiais tem como ponto de partida o planeta Terra, e tão somente. Tudo começa com o homem realizando prospecção e mineração, iniciando o processo. Nessa etapa são retiradas as matérias-primas brutas tais como: carvão, madeira, minérios, petróleo, argilas etc. A extração, refino e processamento dão origem as matérias-primas básicas como: metais, papel, fibras, cimento, produtos químicos, que por sua vez sofrem transformação e processamento para surgir a matéria-prima industrial: ligas, tecidos, cerâmicas, plásticos etc. Com essas novas matéria-primas se fabricam ou montam os bens de consumo: carros,TVs, prédios, pontes etc., que são utilizados de acordo com suas funções e desempenho. Cessada suas funções, o bem de consumo vira sucata ou resíduo e pode então tomar dois caminhos: o primeiro é a reciclagem, em que o material retorna a etapa da matéria-prima básica. O segundo caminho é ser descartado e, mediante processos de degradação, retornar a Terra. E assim se completa o ciclo global.

Experiência no reuso ou reciclagem na indústria automobilística

A Volvo, empresa sueca fabricante de veículos, abraçou a reciclagem como uma forma de reduzir o consumo de recursos naturais não renováveis. A aplicação de materiais reciclados na empresa é facilitada por projeto inteligente na fase de desenvolvimento de produto, tanto para a vida útil de um veículo quanto depois de sua utilização. Hoje, todos os modelos novos da Volvo contêm componentes com materiais reciclados.

A Volvo pratica o que se pode chamar  de "ecomanagement" e  "Ecologia Profunda". A filosofia da empresa é de que monta carros para seres humanos, reconhecendo que os seres humanos são apenas uma pequena parte da vida no nosso planeta. Mas essa pequena parte está provocando um impacto fora de proporções nos recursos reduzidos e no equilíbrio ecológico. Assim, a Volvo reconhece que, se os seres humanos vão viver neste planeta, devem também conviver com este planeta. E isso significa usar os recursos disponíveis consciente e minimizar o impacto de qualquer maneira que conseguir conceber. Em cada passo procura:

  • Minimizar o consumo de energia e de matérias-primas
  • Minimizar a produção de dejetos e de produtos residuais
  • Facilitar a administração de dejetos.

No programa de produção da Volvo, quase todos os materiais em um veículo novo podem ser reciclados. Segundo o objetivo da empresa, cada veículo que chegar ao fim de sua vida útil, todos os materiais e componentes podem ser reciclados ou devolvidos ao meio ambiente, sem desperdício prejudicial e perda de energia. Atualmente, a taxa de recuperação (reciclagem de materiais e recuperação de energia) de um Volvo novo é de 85% (imposição da União Européia a partir de 2006), mas a empresa espera atingir 95% nos modelos 2015. Para alcançar esse objetivo, estão sendo incorporamos estratégias de reciclagem no design e no processo de produção para:

  • Evitar o uso de materiais e substâncias perigosos
  • Facilitar a drenagem e desmontagem de materiais prejudiciais ao meio ambiente
  • Minimizar os recursos usado na produção
  • Projetar os componentes de modo a facilitar a reciclagem de materiais.

A Volvo trabalha em colaboração com outras montadoras e companhias de desmontagem, trituração e reciclagem para otimizar procedimentos de desmontagem, treinar pessoal de desmontagem e minimizar os materiais prejudiciais.

Hoje, mais de 50 mil funcionários da Volvo já receberam treinamento ambiental completo. Agora os programas ambientais estendem-se também para as revendas, empresas vendedoras e departamentos de desenvolvimento. No zelo pelo meio ambiente, a Volvo instalou requerimentos semelhantes para todos os fornecedores.

Reciclagem de diversos produtos

Garrafas PET

Desenvolvido pelos químicos ingleses Whinfield e Dickson em 1941, o PET (polietileno tereftalato) é um material termoplástico. Isso significa que pode ser reprocessado diversas vezes pelo mesmo ou por outro processo de transformação. Quando aquecidos a temperaturas adequadas, esses plásticos amolecem, fundem e podem ser novamente moldados. Mesmo com esse atributo, em alguns países do primeiro mundo sua fabricação é proibida pelos malefícios que podem causar ao meio ambiente. Você reconhece uma embalagem PET quando em sua base for estamapado o número "1" ou a sigla PET(E) no centro das setas. As demais variações não correspondem ao PET.

Principais produtos reciclados a partir da PET
  • Indústria automotiva e de transportes - tecidos internos (estofamentos), carpetes, peças de barco.
  • Pisos - carpetes, capachos para áreas de serviço e banheiros.
  • Uso residencial - enchimento para sofás, cadeiras e travesseiros, cobertores, tapetes, cortinas, vassouras.
  • Embalagens - garrafas, embalagens, bandejas, fitas.
  • Têxteis - roupas esportivas, calçados, malas, mochilas, vestuário em geral, enfeites, lonas para toldos e barracas.
  • Uso químico - resinas alquídicas, adesivos.

Do total reciclado de PET, 40% vão para a indústria têxtil, que é a principal aplicação para o produto.

Segundo a ABEPET - Associação Brasileira de Embalagens PET, cerca 70% de todos os refrigerantes produzidos no País são embalados em garrafas PET. Em 2001 a produção foi de 360 mil ton., o consumo de 270 mil ton., a reciclagem de 89 mil ton., sendo 24,7% da produção e 32,9% do consumo.

Bagaço de cana

Já utilizado em carros japoneses para revestimento interno de bancos e laterais de automóveis. O bagaço de cana, juntamente com caixinhas longa-vida e serragem de pinus, viram também matéria prima para peças internas de automóveis, como encaixes de cinzeiros e suportes de rádio.

Óleo de cozinha usado

Pode ser transformado em biodiesel. Cadeias de lanchonetes que utilizam frituras podem estender seus ganhos.

Ferro-velho colorido

Processo pelo qual microorganismos extraem corantes de sucata. Foi descoberto por empresa israelense e batizado de bio-oxidação. Restos de ferro são transformados em pigmentos de diversas cores. O processo, além de ser econômico, não contamina o meio ambiente e é três vezes mais rápido que os tratamentos químicos de oxidação. Os corantes produzidos são utilizados em tintas, material de construção, plásticos, cosméticos e alimentos.

Adoçante de milho

O milho pode ser processado para extrair álcool. As fibras remanescentes são a nova matéria-prima do adoçante dietético xilitol. Esse tipo processamento é realizado nos Estados Unidos. O xilitol tem três vezes menos calorias que o açúcar comum, gosto mentolado e propriedades que evitam a formação de placas bacterianas nos dentes.

CD's + tampinhas de garrafas plásticas + calças jeans

Esse coquetel pode ser utilizado na reciclagem para constituição de painéis e/ou sistema de aquecimento e refrigeração de automóveis. O isolamento térmico e acústico, entre a carroceria e o acabamento interno, é feito de jeans velhos e outros tecidos usados. A União Européia já obriga as montadoras de automóveis a utilização de 85% da composição de um carro de material reciclável a partir de 2006.

Toner (tintura porosa com carga elétrica) de impressora

O toner é constituído de 85% de poliestireno e 15% de carbono preto. O toner usado pode ser reutilizado como aditivo misturado ao asfalto para recapeamento. Essa experiência já foi realizada na cidade Waco, no Texas, Estados Unidos. Trata-se da Valley Mills Drive, uma avenida de seis pistas que foram recauchutadas adicionando restos de toner ao asfalto. A grande vantagem do toner é que aumenta a resistência do asfalto ao calor. A prática da reciclagem do toner ainda não vingou porque custa caro extrair as sobras de cartuchos usados. A idéia está no próprio fabricante de toner, por intermédio de sua rede de distribuição, criar mecanismos de recolhimento de toner usado. Mediante convênio com universidades, buscar meios econômicos de extrair o produto usado para reciclagem.

Computadores e eletro-eletrônicos

Segundo o informações no site www.reciclagem.com.br, encontra-se em fase final de instalação no município de Jaguariúna-SP, a primeira indústria de reciclagem de computadores e eletro-eletrônicos (telefones fixos, celulares, componentes eletrônicos, fax, copiadoras, rádios, televisões etc.) do Brasil. Provavelmente será a primeira da América-Latina. É preciso ficar atento porque na grande maioria dos casos, ao invés da transformação do eletro-eletrônico em matéria prima para a indústria, o reparo é feito com pedaços de outras máquinas desmontadas e suas peças remetido novamente ao mercado. Outras "recicladoras" simplesmente desmontam os eletro-eletrônicos e enviam peças e partes inteiras para Ásia, África e Leste-Europeu entre outros países, onde supostamente elas devem receber seu destino final, mas muitas vezes voltam ao mercado secundário.

Mas nesse caso, pela primeira vez no mercado nacional se houve falar de uma recicladora de eletrônicos no sentido específico da palavra. Trata-se da A7 Gerenciamento de Resíduos Tecnológicos. A empresa está instalando em seu pátio industrial trituradoras, moedores, compactadores e granuladores. O objetivo é transformar os materiais contidos em eletrônicos (plástico, metais e placas de circuito impresso) novamente em matéria prima para a indústria em geral, como por exemplo, metalúrgicas, indústrias de sopro de plástico, fábricas de cabos elétricos, cerâmicas entre outras, no Brasil e no exterior, pois parte de sua produção será exportada.

Caroços de azeitona

A prensagem do caroço de azeitona vira azeite. Os espanhóis utilizam o bagaço (eles chamam de urujillo) para alimentar usinas de energia elétrica. O processo já é capaz de produzir metade da energia gerada por uma usina nuclear.

Lixo orgânico

Por definição, é todo resto de plantas e animais, folhas secas, restos de alimentos etc. A transformação desse material em adubo, por intermédio da compostagem, é uma das formas mais fáceis de reciclagem. Na compostagem a decomposição da matéria orgânica ocorre por ação de agentes biológicos microbianos e precisa de condições físicas e químicas adequadas para levar à formação de um produto de boa qualidade.

Já no método natural o lixo orgânico é levado para um pátio e disposto em pilhas de formato variável. A aeração necessária para o desenvolvimento do processo de decomposição biológica é obtida por revolvimento periódico. O tempo para que o processo se complete varia de 3 a 4 meses.

No método acelerado a aeração é forçada por tubulações perfuradas sobre as quais se colocam as pilhas de lixo orgânico, ou em reatores rotatórios, dentro dos quais são colocados os resíduos avançando no sentido contrário ao da corrente de ar. Posteriormente, são dispostos em pilhas, como no método natural. O tempo de residência no reator é de cerca de 4 dias e o tempo total da compostagem acelerada varia de dois a três meses.

Outra forma de reciclagem do lixo orgânico é sua utilização como fonte de energia e adubo, através de biodigestores. Biodigestores são equipamentos que, além da decomposição realizada na compostagem, realizam também o aproveitamento do metano, gás que é liberado na bioestabilização do lixo orgânico.

Existe ainda um outro processo de aproveitamento do lixo orgânico: é a prensagem e a transformação em material para construção de casas.

Nas residências que existem quintais, deve-se evitar a queima de folhas secas, principalmente se estiver perto de florestas. O correto é enterrá-las junto com lixo orgânico para que vire adubo, o que propiciará o cultivo de hortas.

Um fato importante que merece providências enérgicas é o lixo hospitalar. É preciso estudos no meio acadêmico para a reciclagem do lixo hospitalar que contamina aterros sanitários. O material contaminado com agentes biológicos, que carregam doenças como Aids, hepatite e tuberculose, são lançados diariamente nos lixões do País sem tratamento prévio. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) permite essa situação de risco, pois dispensou hospitais e outros estabelecimentos do setor da obrigação de incinerar os resíduos produzidos pelos serviços de saúde. É um equívoco enquanto não se achar um processo seguro de descarte.

Vidro

O vidro é um material não poroso que resiste a uma temperatura de 150ºC sem perder suas propriedades físicas e químicas. Isso permite ser reutilizado por várias vezes, pois lhe confere a possibilidade de ser lavado e esterilizado com alto grau de segurança. O vidro é 100% reciclável. Para cada tonelada de cacos de vidros limpos reciclados, 1,2 toneladas de matéria prima deixam de ser gasta, diminuindo a degradação do meio ambiente devido a redução de matéria prima virgem necessária. A introdução dos cacos também reduz os custos de produção. Para cada 10% de vidro reciclado, 2,5% de energia é economizada nos fornos industriais. Os cacos de vidro podem ser utilizados também para a confecção de materiais abrasivos, matéria prima para cerâmica, fabricação de lã de vidro, tijolos de vidro etc.

Vidro não reciclável

Até pouco tempo lâmpadas fluorescentes e a vapor de mercúrio eram consideradas não recicláveis. Graças ao avanço das tecnologias, já é possível a recuperação desses materiais. A Cemig, Companhia Energética de Minas Gerais, desenvolve programa de reciclagem. Veja aqui.

Papel

O papel é uma fibra celulósica que provém da madeira. É um emaranhado de fibras vegetais, que após utilização podem ser desfeitas e refeitas, mediante processos de reciclagem. Recicláveis: Jornais, revistas, cadernos, envelopes, caixas, aparas de papel etc. Não recicláveis: Papéis metalizados, papéis sanitários, papéis plastificados, etiquetas adesivas, papeis sujos. Para cada 1 tonelada de pasta celulósica reciclada são poupadas 54 árvores de pinus ou 34 árvores de eucalipto.

Metais

Os metais podem ser classificados em:

  • Ferrosos: compostos basicamente de ferro.
  • Não-ferrosos: não incluem ferro em sua composição (alumínio, cobre e suas ligas, chumbo, níquel etc.).

O processo de fabricação tem início na mineração, em que são extraídos os minérios utilizados na obtenção do metal desejado. Alguns exemplos de minérios e metais obtidos:

  • Minério - metal obtido
    magnetita - (Fe3O4) ferro/aço
    hematita- (Fe2O3) ferro/aço
    bauxita - (óxidos de alumínio) alumínio
    pirolusita - (MnO2) manganês
    cromita - [(Mg,Fe)2CrO4)] crômio
    magnesita - (MgCO3) magnésio
    dolomita - [CaMg(CO3)2] magnésio
    água do mar - magnésio
    ilemita - (FeTiO3) titânio

Uma vez obtido o minério é necessário que esse passe por um processo de redução em que o componente desejado é "separado" dos demais componentes do minério. As próximas fases são a fusão (deixar o metal no estado líquido) e a conformação (dar forma ao metal).

O processo de reciclagem elimina as etapas de mineração e redução, que são etapas caras, e agrega a etapa de coleta e separação do material. O processo pode então ser reduzido então à coleta, fusão e conformação.

Aço

O aço é o mais antigo material reciclado que se tem notícias. Os soldados romanos já recolhiam as espadas, facas e escudos abandonados nas trincheiras para a fabricação de novas armas. Os materiais de aço não reciclados, deixados no tempo, enferrujam e se decompõem, voltando ao seu estado natural (óxido de ferro). Esse processo é extremamente lento nos aços inoxidáveis, podendo ser considerado inexistente em alguns casos. A reciclagem consiste basicamente da coleta, separação de impurezas, compactação, fundição e conformação. O aço funde a aproximadamente 1.350ºC e pode ser reciclado infinitas vezes.

Latinhas de alumínio (cervejas, refrigerantes e sucos)

Cerca de 80% da produção nacional é de reciclados, graças aos catadores de lixo. O objeto de alumínio mais utilizado para reciclagem é a latinha (62 latinhas = 1Kg), sendo que seu preço gira em torno de US$ 500 a US$ 700 a tonelada e é o material reciclável mais valioso atualmente. O alumínio funde a 660ºC e pode ser reciclado infinitas vezes. Cada tonelada de alumínio reciclado poupa a degradação do ambiente com a retirada de 5 toneladas de bauxita. Além disso, economiza até 40% da energia utilizada na produção primária do metal.


Música de fundo em arquivo MIDI (experimental):
"Allegro", de Mozar
Nota para a seqüência MIDI: *****

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Belo Horizonte, 30 dezembro, 2004

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